20 April, 2007

Reflexões - Ética versus Lei do + Forte


O pensamento não nos oferta, impreterivelmente, uma visão excepcional do significado de acontecimentos históricos isolados. Estes podem insistir em ser um enigma aflitivo para os cristãos, tanto quanto para qualquer um. Para nós, todavia, o mistério encerra, na sua própria opacidade e nos seus inerentes silêncios, uma presença e um sentido que captamos sem os compreendermos em absoluto. E, através desta ligação mística, deste acto de fé, situamo-nos adequadamente em conformidade aos factos que nos circundam, mesmo sem ver com nitidez aonde vão.

Uma coisa é certa: a humildade da fé, se acompanhada das consequências pertinentes — a aceitação do trabalho e do sacrifício demandados por esta tarefa providente — serão muito mais úteis em nos arremeter no amplo curso da realidade histórica do que as soberbas racionalizações dos políticos que se encaram, de alguma forma, como condutores e manipuladores da história. Os políticos podem, sim, fazer história, mas o significado do que estão fazendo é, inexoravelmente, algo como um dialecto que jamais compreenderão e que contraria os seus competentes projectos e transforma todas as suas realizações numa paródia paradoxal de promessas e sonhos.

Sem dúvida, é verdade que a religião num nível leviano, a religião que é infiel a si mesma e a Deus, pode indubitavelmente converter-se no "ópio do povo". Isto ocorre sempre que a religião e a oração invocam o nome de Deus por causas e com propósitos que nada têm a ver com Ele. Quando a religião se estabelece numa mera fachada artificial para fundamentar um sistema social ou económico, quando a religião cede os seus ritos e a sua linguagem aos propagandistas políticos, e quando a oração se metamorfoseia num veículo para um programa ideológico puramente secular, então, sim, a religião se torna um opiáceo. Afrouxa o espírito a ponto de consentir que a ficção e a mitologia substituam a verdade da vida. E isso causa a alienação do fiel, transfigurando o zelo religioso em fanatismo político. A nossa fé em Deus, ao proteger e defender normas tradicionais converte-se, de facto, fé na nossa própria nação, classe ou raça. A nossa ética deixa de ser a lei de Deus e do amor e transforma-se na "lei do mais forte": a prerrogativa estabelecida justifica tudo. Deus está no "Status quo."

E que assim seja!

"A moralidade é a melhor de todas as regras para orientar a humanidade."

Autor: Nietzsche , Friedrich

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