07 January, 2007

Certezas em Época de Incertezas


Esta é uma estranha experiência de quietude. Os dias medem-se grão a grão numa ampulheta de pachorrenta areia, tão vagarosos que se perdem no almanaque, parece-me ter estado constantemente nesta ilha tempestuosa entre árvores, estátuas e caminhos imponentes. Os recursos da magia revelam-se supérfluos; são palavras arremessadas ao mar numa garrafa verde-clara com a fantasia de que sejam descobertas na outra margem e alguma pessoa venha libertar-nos, mas até agora não há resposta. Passei vinte e sete anos em correria, na acção e na batalha, visando balizas que já nem me lembro, a perseguir algo inominável que ficava sempre mais além. Hoje vejo-me compelida a permanecer imóvel e discreta; por muito que corra não chego a lugar nenhum, se grito ninguém me escuta. Deste-me silêncio e paz para deslindar a minha passagem por este planeta, Cristina, para retornar ao passado verídico e ao passado extraordinário, para reconquistar as memórias que outros esqueceram, recordar o que jamais aconteceu e o que talvez aconteça.
Harmoniosa, serena e adormecida, tu és a minha orientadora. O tempo transcorre demasiadamente lento. Ou provavelmente o tempo nem passe, mas sejamos nós a passar através do tempo.
Os dias sobejam-se para reflectir, nada a fazer, só aguardar, enquanto tu subsistes nesse enigmático estado de crescimento, como se estivesses num casulo. Questiono-me sobre que género de borboleta eclodirá quando prosperares, ainda que tenha a certeza que para mim serás a mais perfeita e pitoresca borboleta deste universo.
Passo horas e horas a ler e a escrever ao teu lado. O teu pai – o meu amor – traz-me café e pergunta-me para que me azafamo tanto com estas epístolas intermináveis que tu não podes ler, pois ainda não sabes. Hás-de lê-las um dia, tenho a certeza, e farás pouco de mim com essa tua astúcia e com esse teu sublime olhar que costumas empregar para desconjuntar os meus sentimentalismos.
Espreito para trás a soma do meu destino e, com um pouco de sorte, achei um sentido para a pessoa que sou. Com um empenho feroz tenho andado a vida inteira – vinte e sete anos – a remar rio acima; estou estafada, quero dar meia volta, depor os remos de madeira mosqueada e deixar que a corrente me leve tranquilamente para o mar.
Tive há uns anos uma tia, infelizmente já falecida, que escrevia nos seus cadernos a fim de preservar os trechos arguciosos dos dias e enganar a privação de memória. Eu tento distrair o dia. Os meus pensamentos circulam num incansável remoinho, tu ao contrário estás estacada num presente estático, indiferente por completo das perdas do passado ou dos prenúncios do futuro.
Esta é de facto uma época de incertezas, todavia, tenho a certeza que nunca fui tão bem-aventurada.
Quando desperto durante a noite, para te amamentar e mudar a fralda, olho para o outro lado da cama e vejo o teu papai dormitando um sono inabalável. Vou ao quarto do teu irmãozinho, como ele carinhosamente se auto descreve perante ti, e vejo-o de sorriso nos lábios dormindo um rosado sono encantador. E, é nesse instante que, com os olhos a cintilar de profundo e contagiante júbilo, concluo que consubstanciei os meus sonhos de pirralha (ter uma família só minha) e depreendo o quão feliz sou.

Tenho dito!

"A felicidade não está no fim da jornada, mas sim em cada curva do caminho que percorremos para a encontrar."

(Autor desconhecido)

4 comments:

Anonymous said...

Sandra este comentário não tem nada a ver para aqui, mas já mudaste novamente o endereço do teu blog, para o que tinhas antes. saomateus2005.blogspot.com? Eu só consigo abri-lo neste endereço e não no do Sapo. Agradecia que me informasses

Pico said...

O Blog que eu criei no Sapo tinha a mesma informação que este, mas como o Sapo é um servidor português eu conseguia saber o IP dos comentadores. Contudo, e como existem certas coisas que é melhor ficarem por saber, eliminei esse Blog e fiquei com o que já tinha (e que não me fornece esse tipo de informação).
www.saomateus2025.blogspot.com
Espero que lhe tenha fornecido a informação que procurava.

Anonymous said...

Sandra sou uma leitora assidua do teu blog e gosto muito de tudo o que escreves. Só uma pessoa com um coração de ouro tem a sensibilidade para escrever o que tu escreves.
Parabens.
De uma amiga contagiada pelo bom humor e pela felecidade que irradias todos os dias.

Anonymous said...

poça pá vai fazer xorar outra! :P muito nito