26 November, 2008

Charneca em flor


Enche o meu peito, num encanto mago,

O frémito das coisas dolorosas...

Sob as urzes queimadas nascem rosas...

Nos meus olhos as lágrimas apago...


Anseio! Asas abertas! O que trago

Em mim? Eu oiço bocas silenciosas

Murmurar-me as palavras misteriosas

Que perturbam meu ser como um afago!


E, nesta febre ansiosa que me invade,

Dispo a minha mortalha, o meu bruel,

E já não sou, Amor, Soror Saudade...


Olhos a arder em êxtases de amor,

Boca a saber a sol, a fruto, a mel:

Sou a charneca rude a abrir em flor!


(Florbela Espanca)

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