11 January, 2011

Ir para o Seminário!


Acerca da ida de rapazitos para o Seminário, com frequência ouvem-se expressões de teor negativo: são crianças tolas, não sabem o que fazem, metem-lhes coisa na cabeça, vão enganados… Estas expressões já não se aplicam propriamente aos da actualidade, pois já vão noutras idades.
Mas, mesmo referindo-se aos mais antigos, elas estão muito longe do processo real dos acontecimentos. Vamos explicar-nos - Para tal situemo-nos no princípio do séc. XX. Antes dessa época era possível que algumas decisões fossem influenciadas pelo facto de os sacerdotes serem funcionários públicos antes da República. Mas mesmo assim, houve tantos e tantos homens de elevadíssimo nível sacerdotal. Ainda conheci alguns.
E dos que estavam no Seminário ao instalar-se da República, muitos continuaram e avançaram em circunstâncias economicamente negativas. A República cortou as condições anteriores, e os sacerdotes ficaram no vazio! Mas continuaram a servir… Penso que foram heróicos…
Vamos portanto aos princípios do séc. XX, e distinguimos duas épocas. A primeira vai até os anos 60. A segunda vem de lá até agora.
A primeira, a que vou chamar antiga, foi a minha época. E vou começar por mim mesmo.
Porque é que entrei para o Seminário? O meu itinerário começou quando eu tinha 5 anos. Sim, 5 anos…
Alguém dirá: é isso mesmo, nem criança era ainda… Inconsciência…
Mas, vamos devagar… Há um itinerário. O meu pároco era muito de minha casa. Lembro-me de pensar que os padres não iam para o inferno! Pois foi essa a razão por que pensei que queria ser padre. Eram ideias análogas aos demais que querem ser condutores de camiões, professores, carpinteiros… Depois vem a vida real…
Durante a minha 2ª classe aquela motivação já não existia. Mas continuei com o mesmo projecto, não sei porquê. Penso que tenho tendência a manter-me numa situação. As pequenas dos seus 15, 16 anos diziam-me: Oh Francisco (o meu nome próprio é Francisco…) tu queres casar comigo?
Por minha própria ideia eu respondia: eu vou é casar vocês…. E continuava nela calmamente.
Quando terminei a 4ª classe, fui apresentado ao Bispo D. Guilherme que me perguntou: por que é que queres ser padre? Eu nunca pensara no assunto, e respondi-lhe automaticamente: para salvar almas!
Parece que ele ficou impressionado, pois daí a uns 20 anos, alguém falou-me na­quela resposta.
Só fui para o Seminário em 1938, tendo feito 14 anos poucos dias antes. Quando regressava para as primeiras férias, na Horta, o célebre Mons. Pereira da Silva disse-me:
-Tu então estás no Seminário? E queres ser padre?
-Sim…
-E sabes no que te metes?
-Não sei, mas hei-de aprender…
Esta resposta também deve ter “corrido” porque falaram-me nela uns 30 anos depois. Tudo respondido de imediato….
Chegado aos meus 18 anos, comecei a pensar em ir para a Marinha Mercante. Gostava, e gosto muito do mar. Não era por não querer ser sacerdote.
Fiquei no Seminário até concluir os estudos necessários para entrar na Escola Náutica. Quando eles terminaram, não me apeteceu sair, e fiquei mais um ano. Sentia-me bem.
O que é certo é que, durante esse ano, comecei a pensar que tinha mais que fazer como sacerdote do que como comandante dum barco. E continuei até hoje.
E os outros? Um dos meus grandes amigos, que foi um grande sacerdote, resolveu ir para o Seminário porque uns seminaristas lhe disseram que lá se jogava futebol. Conheci outro grande sacerdote que foi simplesmente para estudar. Depois queria ir para a Marinha de Guerra. Mas ligou-se à “vocação”.
E mais? Uns porque era “moda”, outros porque lhes sugeriram, outros porque, simplesmente, queriam ser padres…
Claro que, chegados os 16,17 anos, os pensamentos mudavam e punha-se a questão. Alguns desistiam, outros continuavam já em atitudes diferentes, o Seminário era um ambiente de aprendizagem, descoberta, reflexão, dúvida, decisões…
E recentemente? As situações são muito diferentes. Já não se vai para o Seminário para estudar. Estuda-se em qualquer parte.
Uns vão porque descobriram o sentido do sacerdócio, da vida, da Igreja, do serviço espiritual. Outros porque amigos, seminaristas ou sacerdotes, os entusiasmaram; outros como resultado de reuniões, cursos, retiros… Enfim, motivações mais profundas.
Naturalmente terão muito caminho para andar, muita vida a amadurecer. Alguns voltarão para trás, mas a maior parte amadurecerá…, e caminharão para o sacerdócio.
O nosso tempo estranha isso, em especial por causa da obsessão sexual. Mas tudo foi muito estranho para os sacerdotes dos primeiros séculos, a começar pelos apóstolos. Depois foram os tempos de perseguição. Depois, tantas e tantas situações difíceis. Mas é sempre verdade o que Ele diz: Eu estarei convosco até ao fim dos tempos – não vos deixarei órfãos.

Autor: Caetano Tomáz

Nota: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, todavia, se este provérbio não se concretizar, daqui a uns anos terei, com muito orgulho, um filho padre.

E esta, eih? 

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